Reforma Tributária e Simples Nacional: o que muda na prática?
Capítulo 2
Se você é dono de uma micro ou pequena empresa, provavelmente já ouviu falar que o Simples Nacional continua existindo mesmo depois da aprovação da Reforma Tributária. Mas será que isso significa que nada vai mudar para quem está nesse regime tributário?
No segundo capítulo da série Reforma Tributária Simplificada, vamos aprofundar esse assunto e mostrar como as novas regras — mesmo sem alterar diretamente o regime simplificado — trazem impactos importantes no dia a dia das empresas de pequeno porte, principalmente para quem atua no mercado B2B.
Vamos falar sobre a substituição de tributos, o fim do efeito cascata, o conceito de não cumulatividade plena, os novos créditos tributários e a chamada opção pelo regime híbrido.
Tudo isso de forma clara e prática, para que você entenda como essas mudanças podem afetar sua carga tributária, suas vendas e até a escolha do regime tributário ideal para o seu negócio.
Siga com a leitura e descubra como ficou o Simples Nacional com a Reforma Tributária — e por que você deve ficar atento às novas estratégias para manter sua competitividade.
Como ficou o Simples Nacional com a Reforma Tributária?
Primeiramente, é essencial compreender que a tão discutida Reforma Tributária, apesar de promover uma reestruturação significativa no sistema tributário brasileiro, não alterou diretamente a estrutura legal do Simples Nacional.
Ou seja, o regime simplificado, criado com o objetivo de facilitar o cumprimento de obrigações fiscais por empresas de pequeno porte, permanece em vigor com suas diretrizes originais preservadas.
Atualmente, o Simples Nacional continua sendo uma das principais portas de entrada para a formalização de pequenos negócios no Brasil.
Trata-se de um regime tributário diferenciado, que busca reduzir a carga tributária, simplificar procedimentos e oferecer uma estrutura mais acessível para quem está iniciando um empreendimento. As empresas de pequeno porte, ao optarem por esse modelo, ainda contam com os seguintes benefícios:
- Apuração unificada de tributos federais, estaduais e municipais por meio do DAS (Documento de Arrecadação do Simples Nacional);
- Alíquotas variáveis e progressivas, definidas de acordo com a faixa de faturamento da empresa;
- Redução das obrigações acessórias, permitindo uma gestão fiscal mais ágil e menos custosa;
- Tratamento favorecido em licitações públicas, além de condições diferenciadas em linhas de crédito e programas de incentivo.
Analogamente, essas vantagens tornam o Simples Nacional um dos regimes tributários mais vantajosos para microempresas e empresas de pequeno porte que atuam, sobretudo, no varejo ou na prestação de serviços ao consumidor final.
Contudo, é necessário deixar claro que, embora o arcabouço legal do regime simplificado continue intacto, isso não significa que as empresas do Simples Nacional estejam totalmente alheias às transformações promovidas pela nova legislação tributária.
Afinal, a substituição de tributos, a introdução da não cumulatividade plena e a criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) representam mudanças estruturais no funcionamento do sistema tributário brasileiro, com impactos indiretos que exigem atenção.
O que muda com o novo IVA Dual?
O IVA Dual é composto por dois novos tributos, cada um com abrangência e finalidade específicas:
- Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que será de competência compartilhada entre estados e municípios, substituindo o ICMS (estadual) e o ISS (municipal);
- Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, que unifica o PIS, a COFINS e o IPI.
Essa substituição de tributos visa uniformizar a base de cálculo, eliminar o efeito cascata e promover maior transparência na formação de preços ao longo da cadeia produtiva.
Além disso, a grande inovação dessa nova estrutura é a adoção plena do princípio da não cumulatividade: ou seja, passa a ser garantido o direito de utilizar créditos tributários relativos a tributos pagos nas etapas anteriores de produção e comercialização, independentemente da finalidade ou setor da atividade econômica.
Embora o Simples Nacional, por ora, permaneça fora da aplicação direta do novo IVA, as repercussões da Reforma Tributária alcançam, ainda que de forma indireta, as empresas de pequeno porte.
Isso ocorre principalmente quando essas empresas atuam como fornecedoras para outras que operam sob o Lucro Presumido ou o Lucro Real — ou seja, dentro do chamado regime normal de tributação.
Analogamente, uma microempresa que presta serviços ou vende produtos para uma empresa optante pelo Lucro Real, por exemplo, passa a competir com fornecedores que concedem créditos integrais de CBS e IBS.
Assim, mesmo que o regime simplificado do Simples Nacional continue funcional, a inexistência ou limitação dos créditos tributários gerados por essas empresas de pequeno porte pode afetar a sua atratividade comercial no ambiente B2B.
Créditos tributários e a nova competitividade para empresas do Simples Nacional
Um dos principais pilares da Reforma Tributária é, sem dúvida, a adoção da não cumulatividade plena como regra estrutural do novo sistema tributário brasileiro.
Esse conceito transforma a forma como os impostos são apurados e pagos ao longo da cadeia produtiva, conferindo um papel central aos créditos tributários.
O objetivo é claro: evitar o pagamento repetido de tributos sobre os mesmos valores e, com isso, reduzir a carga tributária de forma mais justa e transparente.
Nesse novo contexto, as empresas enquadradas no Lucro Presumido e no Lucro Real passam a valorizar ainda mais a possibilidade de aproveitar integralmente os tributos pagos nas fases anteriores, o que impacta diretamente na escolha dos seus fornecedores.
Ou seja, quanto maior o valor dos créditos tributários gerados por um fornecedor, maior sua atratividade no mercado, especialmente no ambiente B2B (business to business).
Atualmente, as empresas de pequeno porte que optam pelo Simples Nacional possuem limitações significativas no que se refere à geração de créditos tributários para seus clientes.
Isso ocorre porque o recolhimento unificado por meio do DAS (Documento de Arrecadação do Simples Nacional) não permite a separação individualizada dos tributos federais e estaduais, como o PIS, COFINS, ICMS e ISS, restringindo o aproveitamento de créditos pelas empresas do regime normal de tributação.
No entanto, a Reforma Tributária promove um avanço importante nesse cenário.
A partir da reestruturação e da implementação do IVA Dual, mesmo as empresas que permanecerem no regime simplificado do Simples Nacional poderão oferecer créditos de IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) aos seus clientes.
Contudo, é importante frisar que esses créditos tributários serão proporcionais ao montante efetivamente recolhido via DAS, e não pela alíquota cheia dos tributos individualizados, como ocorria anteriormente com PIS e COFINS.
Opção pelo regime híbrido: oportunidade ou risco calculado?
Diante dessas novas diretrizes, surge uma inovação relevante e que merece atenção redobrada dos empreendedores: a opção pelo regime híbrido de recolhimento.
Trata-se de uma alternativa introduzida pela Lei Complementar 214/2025, que permite que as empresas enquadradas no Simples Nacional recolham a CBS e o IBS fora do DAS, utilizando as alíquotas aplicáveis ao Imposto sobre Valor Agregado (IVA), como fazem as empresas do Lucro Presumido e do Lucro Real.
Essa opção pelo regime híbrido representa uma abertura inédita para que as empresas de pequeno porte gerem créditos tributários integrais para seus clientes, ganhando competitividade no mercado B2B, sem necessidade imediata de migração para o regime normal de tributação.
Em contrapartida, essa escolha implica maior complexidade na apuração de tributos, exigindo mais atenção ao planejamento tributário.
Portanto, adotar o sistema híbrido de recolhimento pode ser altamente vantajoso em determinados contextos, mas também representa um risco calculado. É essencial considerar:
- A avaliação minuciosa da carga tributária efetiva;
- A comparação detalhada com os regimes do Lucro Presumido e Lucro Real;
- O suporte de profissionais especializados em planejamento tributário e contabilidade estratégica.
Além disso, a legislação prevê que essa escolha do regime híbrido poderá ser feita duas vezes por ano, com efeitos iniciando em janeiro ou julho.
Essa flexibilidade oferece um espaço importante para ajustes estratégicos, permitindo que o empreendedor teste diferentes modelos e avalie qual oferece o melhor equilíbrio entre custo tributário, acesso ao crédito fiscal e simplificação administrativa.
Planejamento tributário: peça-chave na escolha do regime tributário
Com todas essas mudanças, o planejamento tributário passa a ser elemento central para a sustentabilidade das empresas de pequeno porte.
Será necessário considerar o perfil da empresa, a margem de lucro, o tipo de cliente (empresa ou consumidor final) e a possibilidade de gerar ou transferir créditos tributários relevantes.
A escolha do regime tributário ideal — entre permanecer no regime simplificado, migrar para o Lucro Presumido, o Lucro Real ou adotar o sistema híbrido de recolhimento — dependerá de cálculos específicos, que devem considerar o impacto real da Reforma Tributária no segmento de atuação.
Abertura de empresa no Simples Nacional: novas variáveis no planejamento inicial
Quem está planejando a abertura de empresa no Simples Nacional deve considerar, agora mais do que nunca, as novas variáveis introduzidas pela Reforma Tributária. Embora o regime simplificado continue sendo vantajoso para quem busca reduzir burocracias e tributos, a análise prévia se torna ainda mais relevante.
É preciso perguntar:
- A empresa atuará com o consumidor final ou com outras empresas?
- Os produtos ou serviços terão impacto significativo na concessão de créditos tributários?
- A carga tributária do Simples ainda será vantajosa frente ao regime normal de tributação?
Contar com um planejamento tributário desde a abertura pode evitar surpresas desagradáveis e otimizar o potencial de crescimento do negócio.
Conclusão
Em síntese, como ficou o Simples Nacional com a Reforma Tributária? Ele permanece formalmente intacto, mas inserido em um novo contexto fiscal que exige atualização e estratégia.
As empresas de pequeno porte que atuam no B2B devem reavaliar seus modelos, analisar as vantagens da opção pelo regime híbrido, e considerar os impactos da substituição de tributos, da não cumulatividade plena e do novo Imposto sobre Valor Agregado.
O sistema tributário brasileiro está passando por uma transformação histórica. E embora o Simples Nacional ainda represente a via de entrada mais acessível, ele agora convive com regras que afetam sua inserção no mercado.
Para não perder competitividade, é crucial investir em planejamento tributário e reavaliar constantemente a escolha do regime tributário.
A adaptação será o grande diferencial competitivo nesta nova era fiscal.
A finalidade desse artigo é meramente informativa. Recomenda-se a consulta a um advogado habilitado para orientação específica conforme sua situação. Dúvidas? Entre em contato conosco! Será um prazer orientá-lo.